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terça-feira, junho 01, 2004

The Scarlet Letter - 14/5

Lisboa, 14 de Maio de 2004

Assunto: Bilhetes Para a Final da Taça

Exmº Sr. Luís Filipe Vieira
Presidente do Sport Lisboa e Benfica
Exmº Sr. Dr. Tinoco Faria
Presidente da Assembleia Geral do Sport Lisboa e Benfica
Exmº Sr. Dr. Carlos Colaço
Responsável pela Organização dos Jogos

Peço aos senhores o favor de dispensarem 10 minutos do vosso tempo e fazerem o obséquio de ler esta minha carta, porque ela expressa o sentimento dos muitos milhares de sócios que se sentiram ofendidos e revoltados pela autêntica VERGONHA que se passou na manhã do dia 12 de Maio do corrente ano, dia da venda dos ingressos para a Final da Taça.

Tinha a intenção de adquirir bilhetes para mim (sócio desde que nasci, Título Fundador, accionista da SAD, subscritor do empréstimo obrigacionista), para o meu pai (sócio vitalício, Título Fundador, accionista da SAD, detentor de um lugar de estacionamento no piso -1) e para o meu irmão (sócio desde que nasceu, Título Fundador, accionista da SAD). Infelizmente, o meu avô (sócio vitalício, Título Fundador, accionista da SAD) de 87 anos já não pode subir as escadas do Estádio Nacional, pelo que eu só iria comprar três bilhetes.

Tendo o Benfica, ao que consta, cerca de 70.000 sócios pagantes é claro que a procura seria sempre muitíssimo superior à oferta dos seis mil bilhetes. Ou seja, teria de haver um critério para a compra dos bilhetes. Alguém teria de ser favorecido. Gostaria de vos perguntar o seguinte: em relação a ter privilégios sobre os bilhetes, qual é a diferença entre mim próprio (sócio desde os 15 dias, título fundador da Nova Catedral, que não falha nenhum jogo em casa, accionista da SAD, subscritor do empréstimo obrigacionista da SAD, que tinha lugar cativo no estádio antigo) e uma pessoa que se tenha feito sócia no dia anterior à venda? Eu respondo-lhes: NENHUMA! Para efeitos de aquisição de bilhetes para o jogo mais importante que o nosso clube vai realizar em oito anos, não havia diferença nenhuma de estatuto entre os sócios. Sinceramente, acho muito triste! O jornal “A Bola”, na sua edição do dia 12 de Maio, refere que no Porto havia uma banca especial para sócios com mais de 20 anos de filiação, que tinham direito a levar dois bilhetes mostrando um só cartão e os outros sócios poderiam levar dois bilhetes se mostrassem dois cartões. Resultado? Dos seis mil bilhetes colocados à venda, sobraram 400 para o dia seguinte! Ainda por cima, no passado, aconteceu algo semelhante no Benfica: na época 1995/96 (a fatídica final Benfica-Sporting do “very light”), cada pessoa (sócio ou simpatizante) só podia adquirir dois bilhetes. Parte-se-me o coração ao dizê-lo, mas hoje em dia há clubes que respeitam mais os sócios dedicados do que o Benfica!

Mas ainda mais do que ser associado há duas décadas, outra vantagem que seria legítimo pensar ter seria o título fundador. Querem estimular as pessoas a adquirir o título fundador? Que vantagens é que dão? O nome na cadeira? Sim, de facto, eu gosto de saber que há uma cadeira no Estádio da Luz com o meu nome, mas por 2.400€ + 400€/ano de bilhete de época esperaria ter um pouco mais de privilégios para além do nome na cadeira, de um diploma, de um cachecol e de um “pin”. Quem é que o Benfica deve privilegiar? Quem é dedicado e se sacrifica pelo clube ou os sócios candongueiros? Como o Porto fez em relação ao direito de preferência que os detentores de lugares anuais tinham para os jogos da Liga dos Campeões, porque é que o Benfica não dá aos detentores dos Títulos Fundadores (que, ainda por cima, são muito mais caros do que os lugares anuais “lá de cima”) direito de preferência, nem que seja durante um só dia, sobre os bilhetes para eventos onde já se sabe que a procura é muito superior à oferta, como as Finais da Taça?

Como, para o Benfica, os Títulos Fundadores (que, segundo referiu várias vezes o Sr. Mário Dias em inúmeras entrevistas, parece que são essenciais para o financiamento do novo Estádio) são tratados como todos os outros sócios (e cujos “privilégios” se restringem àqueles que referi no parágrafo anterior), e os sócios com mais de duas décadas servem para dar 20 votos às Direcções nas eleições, mas não servem para ter vantagens deste género, tive de ir para a fila para tentar adquirir os bilhetes. O critério escolhido pelo Benfica foi a ordem de chegada. Ora bem, cheguei às 7h15 e fui substituído pelo meu irmão às 12h30 (porque tinha uma reunião profissional às 15h à qual não poderia faltar) e ele saiu da fila às 17h, quando foi avisado de que os bilhetes já estavam esgotados. Ou seja, perdi meio-dia de trabalho e o meu irmão tempo de estudo, já que tinha um teste na manhã do dia seguinte, para nada! Na altura que eu cheguei à fila, estavam cerca de 500 pessoas à minha frente. Quer isto dizer que os seis mil bilhetes disponíveis ficaram supostamente nas mãos das primeiras 500 pessoas que chegaram. Digo supostamente porque o problema foi que a total falta de organização permitiu que muitas delas dessem o “golpe” na fila. Só colocaram um polícia a vigiar o gradeamento que dá acesso ao showroom, através das escadas que ficam em frente ao ex-restaurante “O Silva do Benfica”, cerca das 10h30, permitindo que várias pessoas se infiltrassem na fila e outras, que chegaram muito mais tarde, dessem os cartões aos mais adiantados para a compra.

Fosse este o maior problema, estaríamos relativamente bem. Acreditei que, mesmo assim, ainda conseguiria comprar os bilhetes. Só que o que foi INACREDITÁVEL foi que o Benfica não tenha limitado as vendas por pessoa. Cada cartão cada bilhete. Sabem o que se passou? Houve pessoas a comprarem 250 bilhetes (número dado por um polícia que vigiou a fila dentro do showroom) para as “casas do Benfica”. Curiosamente, as “casas do Benfica” eram junto ao muro que está sobre o showroom e os bilhetes que custavam 20€ eram revendidos a 150€ (cf. jornais “Record” e “O Jogo” do dia 13 de Maio). Ou seja, o próprio Benfica deu azo a que houvesse candonga! Podem argumentar que não é justo que alguém apresente cartões de sócios válidos e com as quotas em dia e não possa levar os bilhetes. Pois é, mas quem é que fica mais prejudicado? Essas pessoas que acabam por revender os bilhetes no mercado negro ou os milhares de sócios que, como eu, acordaram mais cedo, estiveram dez (!) horas na fila e não conseguiram arranjar bilhetes? Porque é que não limitaram a venda, por exemplo, a quatro bilhetes por pessoa no máximo (e isto para não dizer dois, como fez o Porto)? Isto permitiria uma muito maior igualdade e justiça perante os sócios.

E mesmo que os ditos bilhetes fossem hipoteticamente para as Casas, porque é que as 249 pessoas que entregaram o cartão àquela pessoa têm mais direito do que eu, que estive na fila durante tanto tempo, a ter bilhete? Mesmo não havendo vantagens para os Títulos Fundadores ou para os sócios com mais de 20 anos de filiação, qual é a justiça neste caso? Alguém que acorda cedo e está dez horas na fila, ou outra pessoa que empresta o cartão ao amigo e está descansadinho à espera do bilhete? Uma coisa é uma pessoa saber que à sua frente cada um só poderá comprar até quatro bilhetes, outra é não saber se irão ser um ou 250! Fazem ideia do stress e ansiedade que isto provoca, sempre na expectativa de ver se sobram bilhetes para nós ou não? De certeza que nenhum dos senhores passou por esta situação, mas creiam-me que é MUITÍSSIMO frustrante estar tanto tempo à espera, não conseguir bilhetes, e depois ver os mesmos serem traficados no mercado negro! Desde a época 1984/85 que eu não perco ao vivo uma final da Taça em que o Benfica participa, e vou perder este ano por causa de sócios candongueiros e com a conivência do próprio Benfica!

Esperando que esta carta encontre eco junto de V. Exas e para que possamos construir um Benfica mais justo e menos ingrato para quem realmente gosta dele, despeço-me

VIVA O BENFICA!

Atenciosamente,

S.L.B.

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